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sexta-feira, 29 de julho de 2011

Anti-cidadania

          Desde 2008 o IBOPE tem realizado, a pedido da ONG Nossa Ilha Mais Bela, pesquisas sobre a «percepção cidadã em Ilhabela». O objetivo destas pesquisas tem sido verificar a opinião de moradores, turistas e veranistas sobre diversos aspectos da cidade. Entre os resultados obtidos, o mais interessante é aquele que não se mostra através dos números e que, ao invés, só pode ser encontrado através de uma leitura mais atenta dos gráficos e números.

          Muitas das perguntas incluídas nas pesquisas referem-se aos problemas que mais afetam a cidade, à visão que as pessoas têm desses problemas e às prováveis soluções. A síntese, reveladora por si, demonstra que 1) as pessoas não se vêem como responsáveis pelos problemas que as atingem ou como causadoras destes problemas e 2) atribuem ao poder público as possíveis soluções.

          É evidente que esse estado de coisas não é exclusivo do grande porte de uma nação inteira — invariavelmente decorrente do populismo e do paternalismo do Governo Federal —, ele se constrói e se revela também na escala dos municípios, por pequenos que sejam. Neles, como em Ilhabela, é fácil notar aqueles traços característicos da cultura brasileira, sobretudo quando os debates resvalam em assuntos públicos:

1) A culpa pelos problemas que afetam uma cidade é sempre do poder público. Portanto, as soluções também são de sua responsabilidade exclusiva.

2) Ainda que o poder público seja visto como o alfa e o ômega da vida dos cidadãos, a pastosa maioria limita-se a resmungar diante dos noticiários e a amaldiçoar o político A ou o político B. Não se percebe, é claro, a ausência de conexões lógicas entre a constatação do peso do poder público sobre nossas vidas e a reação diante deste fato, isto é, o ato de resmungar.

3) A rançosa minoria, embora bem-intencionada, entrega a própria cabeça em bandejas de prata chamadas comissões, sessões de Câmara, audiências públicas e outras reuniões cívicas, sem, é claro, demonstrar o mais mínimo domínio dos temas discutidos, tampouco aquele interesse mínimo que conduz o indivíduo aos livros e que os afasta das polêmicas fáceis e rasteiras. Dedica-se mais tempo às patotas do que ao estudo e à reflexão.

4) Todos, sem exceção, brigam por direitos, privilégios e benefícios sem perceber que todas estas coisas implicam a contrapartida do dever, o que redunda num atoleiro de leis, políticos, decretos, portarias, repartições, licitações, portarias, fiscais, secretarias, verbas e impostos, impostos e mais impostos.

          Às pessoas que possuem estes traços não ocorre que o reconhecimento de si mesmo como parte de um emaranhado de acontecimentos públicos e como repetidor de idéias correntes constitui a própria definição de anti-cidadania. A cidadania começa quando o indivíduo torna-se capaz de ver-se como alguém dotado de um mínimo de autonomia e de responsabilidade pelos próprios atos. Só depois disso é possível compreender os acontecimentos públicos e as idéias correntes, bem como o papel que o próprio indivíduo tem nisso tudo. Não há melhor definição de anti-cidadania do que a imagem do sujeito que se queixa do mau cheiro de um lugar sem perceber seus próprios dejetos espalhados no chão. O bom cidadão é aquele que, antes de falar, antes de agarrar-se ao queixume padrão, cumpre sua parte e que, consciente do custo de cada «direito», esforça-se para depender cada vez menos deles. O bom cidadão raramente precisa de prefeitura ou de governo.

Autor: Christian Rocha
http://christianrocha.wordpress.com/2011/07/20/anti-cidadania/#more-2672

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