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sábado, 15 de janeiro de 2011

Carta de Teresópolis

Teresópolis, 15 de janeiro de 2011.

        Não é nada fácil descrever o que tenho visto e vivenciado desde a madrugada do dia 12. Já presenciei outras tragédias aqui na cidade, mas de tal porte jamais ouvi, sequer, contar. Aliás, dizem os especialistas que esta é a maior tragédia natural do País... mas eles dizem tantas coisas.
        O que sei, na verdade, é que no final do meu plantão de hoje, tinha contabilizado 1200 desabrigados; 1300 desalojados; 238 corpos resgatados sem vida, sendo que desses, 168 já haviam sido identificados e liberados para sepultamento (sem direito a velório ou despedida da família, pois não há tempo para isso; em covas rasas e identificadas apenas por uma cruz numerada); e um número ainda desconhecido de pessoas desaparecidas. O que sei, é que os olhos da cidade, inchados e embaçados pelas lágrimas, ainda não acreditam naquilo que vêem e que a respiração fica em suspenso a cada nova pancada de chuva. Sei das crianças que, em sua mágica inocência, brincam de roda em meio aos colchões que lotam a quadra poliesportiva.
        Sei também que as mudanças climáticas não podem servir de desculpas para os governantes que nada fizeram para conter as construções desordenadas, as invasões, os desmatamentos; que não cuidaram das políticas públicas com a atenção devida; que não investiram em prevenção e que agora precisarão gastar muitas vezes mais na reconstrução. Sei ainda que os danos causados na alma da minha gente jamais serão apagados. Bairros inteiros foram devastados. Ricos e pobres estão sofrendo a perda de bens materiais, de amigos e familiares. O cenário é de desolação. É como se um tsunami tivesse acontecido aqui.
        Muitos bairros ainda estão sem luz e a água já é escassa. A previsão é de ficarmos completamente sem abastecimento durante os próximos 15 dias. Não bastasse tudo isso, hoje um grupo de oportunistas, baderneiros e bandidos espalharam pânico na cidade. Comerciantes, instituições bancárias, supermercados, shoppings, farmácias, clinicas e consultórios fecharam suas portas com medo de saques e assaltos. Teresópolis parecia uma cidade fantasma até parte da tarde. Depois o Estado e a União mandaram reforços e os policiais – que antes estavam auxiliando nas buscas e transportando corpos – voltaram a cuidar da segurança. (mas as portas do comércio continuaram fechadas).
        A situação atual é gravíssima. Mas preocupa-me ainda mais o período “pós-comoção”, quando a dor do outro já não incomodar tanto; quando a lama virar poeira e o vento a espalhar por ai.
 * Teresópolis gera cerca de 80% dos produtos do mercado de agricultura do grande Rio; atendendo também a toda Região dos Lagos, Costa Verde indo até Ubatuba(SP), Juiz de Fora(MG) e o Norte Fluminense. A maioria dessa produção vem das plantações no segundo e no terceiro distrito, ambos foram destruídos pelas águas. A agricultura é um dos três pilares da economia local.
 * Teresópolis irá (?) sediar o Salão Estadual de Turismo, em maio. O que temos agora para oferecer? Que turista vai querer visitar o caos? Turismo é o segundo pilar.
 * Sem o dinheiro da agricultura e sem o dinheiro do turismo, a tendência é uma enorme retração na economia. Como conseqüência as vendas no comércio despencarão. Comércio é o terceiro pilar.
        O que será de Teresópolis daqui a seis meses? Essa pergunta não me sai da cabeça. Por outro lado, entendo também que essa pode ser uma grande oportunidade de recomeçar a cidade de forma correta. Com planejamento, políticas públicas sérias, eficientes e eficazes, transparência e retidão nas ações e, sobretudo, com uma população mais atenta e consciente, mais participativa e responsável.

Rita Telles é secretária executiva do Movimento Nossa Teresópolis RJ.